sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

O momento certo

Todas as eleições num clube de futebol são momentos importantes. É nelas que se decide quem irá estar ao comando, mas sobretudo quem irá definir o que é e o que poderá ser o clube no futuro. Mais significativo que isto não fica. Nas últimas eleições do Sporting o foco era a vertente financeira, o clube vivia amarrado por pesados endividamentos e sem margem para revitalizar desportivamente aquilo que já era um verdadeiro sufoco de agendas de empresários que detinham mais poder no balneário da equipa que o próprio Sporting.
Os adeptos cansaram-se de projectos e projects, de finance e finanças e tudo que queria era eleger alguém que garantisse o máximo de travão à delapidação do pouco património desportivo e físico que ainda restava. As palavras "banca", "investidores" ou "reestruturação financeira" foram repetidas ciclicamente em todos os discursos e análises.

O melhor mérito que se pode dar ao mandato de BdC é que nas próximas eleições o tema das finanças do clube não será tão esmagador. O clube fez um intenso trabalho de emagrecimento e de negociação, aproveitando o facto de também a banca não ter interesse em liquidações ridículas e execuções de contratos que em nada beneficiariam as partes. Apesar de toda a campanha de choraminguice vermelha (curioso como os que se dizem ricos reclamarem do pouco que se dá a quem chamam arruinados) a reestruturação foi feita, está a ser cumprida e, para espanto de muitas aves de agoiro, está a devolver ao Sporting alguma autonomia, que em último grau também tem favorecido o saldar faseado das dívidas. Ao contrário de muitos a quem empurraram os desfalques para o buraco sem fundo dos "bancos maus", o Sporting está a pagar as suas dívidas.

Mas toda a recuperação financeira tinha um alvo bastante específico que ia muito para além do evitar de fechar as portas. BdC bem cedo mostrou que o seu grau de exigência não se apaziguaria com o modelo de clube "bem comportado" que olhando só para os números aceitaria um papel de subserviência aos "ganhadores" de títulos nacionais. Lutar era verbo e em mais do que uma ocasião neste mandato, o Sporting foi a equipa que melhor futebol praticou, disputando os títulos como qualquer candidato natural. O mandato acabará infelizmente sem um troféu de campeão nacional, mas andámos muito perto de o conseguir e mais do que isso, a distância de modelos desportivos entre o Sporting e Porto/Benfica é hoje muito menor. Existe, mas é muito menor...e lamento dizer aos adeptos dos nossos rivais, mas só não será mesmo igual porque as suas subserviências aos interesses dos empresários ainda faz com que a curto prazo existam mercados que o Sporting não acede. A longo prazo a história será bem diferente e chegará o dia em que uma pequena venda do Sporting equivalerá a uma boa venda dos nossos rivais.

Se o primeiro objectivo do mandato de BdC foi alcançado, a segunda prioridade não o foi. Apesar da crescente vitalização da massa adepta e do aumento exponencial do número de sócios, desportivamente o trabalho ficou ligeiramente aquém do pretendido. É preciso que nos lembremos que quando BdC tomou o poder, o clube lutava para não ser humilhado na tabela classificativa e desde então deixámos de lutar pelo acesso à Liga Europa e alinhámos maioritariamente na disputa pelas primeiras posições. Parece fácil, parece até natural, mas há quatro anos atrás, o ponto onde estamos agora seria efectivamente um sonho. O cinismo e a hipocrisia não devem prevalecer em relação à verdade e à história do nosso clube. Nós estivemos falidos, a centímetros de um PER, a segundo de capitular o estatuto de "grande".

Nestas eleições, muitos evitarão de fazer estes flashbacks, dando-nos a comer que o que foi feito qualquer um o faria e que há mérito residual em chegar onde chegarmos, mais do que uma estratégia eleitoral para minorizar o candidato que é o actual presidente...isso é a pior forma de reconhecer o caminho de regresso que muitos adeptos fizeram ao voltar a ser séocio, ao voltar a visitar Alvalade e a contribuir para tudo o que rodeia a clube. Que não vão por aí, pela estrada de negar todas as pedras que afastámos no nosso caminho, pois se alguns não mexeram um dedo e preferiram assistir de longe nos seus "camarotes" à revitalização do clube, não merecem hoje afirmar que o colocarão noutro patamar se forem eleitos. Onde estiveram durante 4 anos? O que viveram nestes 4 anos?

Ouço muitas pessoas a falar sobre o divisionismo que comandou o mandato desta actual Direcção, mas fico sinceramente a acreditar que muitas pessoas olham ainda para o Sporting como um clube de cavalheiros, um emblema de recriação para o passeio de virtudes de certas elites e não um clube de futebol que existe para dar alegrias e bons espectáculos a milhões de fãs espalhados pelo mundo. De muitas formas a visão de muitos "notáveis" e "linhagens" do Sporting é pequena demais e amarra o clube a uma cartilha de "bons comportamentos" que estão completamente desactualizados face ao panorama do futebol luso e mundial. Continuo a ver demasiada gente a querer mexer em merda com punhos de renda. Este é o momento certo para enterrar de vez a maior divisão de todas dentro do Sporting. Não existe Sporting deste e daquele, só há um e terá de ser igual para todos, desde o homem do lixo até ao banqueiro, do presidiário ao cirurgião. E quanto mais igual, melhor.

O melhor que Bruno de Carvalho trouxe ao Sporting é o orgulho e a crença de que não somos menos, nem menos capazes que qualquer outro emblema e isso só foi possível porque ninguém mais do que ele acredita nesse estatuto, nesse ideal. De uma forma mais pura e mais ingénua, BdC é o intérprete mais incomodativo do lema e inspiração do nosso clube. E isso agita as invejas de quem não consegue orgulhar-se do sportinguismo de outros.
Podemos discutir os "estilos" e a validade de algumas opções deste presidente, mas este também é o momento certo para nos deixarmos inspirar por quem se dedicou a uma visão máxima do clube e muitas das vezes desespera com a falta de militância, espírito de luta e tenta vezes sem conta, brutamente e sem tacto, dar vida a um corpo que desejava mais sólido, uno e dinâmico. Desejo, sinceramente, ao Presidente Bruno de Carvalho a humildade e a ponderação que lhe terá faltado pontualmente para resistir aos momentos muito bons e aos piores. Mas também lhe desejo toda a saúde, pujança e capacidade para enfrentar durante mais 4 anos todos os fantasmas e cadáveres que ainda persistem nos corredores de Alvalade e especialmente nas cabeças de muitos "velhos" que se recusam a "seguir" o comando de seja quem for, tal como um "cavaleiro nunca será peão" e outras velhas parábolas que se agarram aos últimos suspiros de um regime social caduco e bafiento. E não tenhamos qualquer dúvida de que o mais difícil estará por fazer, pois acredito profundamente na frase batida de que "o mais difícil de mudar são as mentalidades". Difícil, mas não impossível.


SL


5 comentários:

  1. Vamos lá ser sérios. Estivemos falidos, à beira de um PER. Mas o que é a reestruturação financeira senão um PER adaptado à empresa? Nas mãos dos bandos com todos, sem exceção, activos penhorados, até as contas bancárias estão penhoradas, não é estar falido? O que é isso senão um PER?

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    1. A ver dessa forma, também o Porto e o Benfica atravessam um PER. Pois também eles cumprem acordos, pagam juros e hipotecam receitas e até jogadores para manter o status quo financeiro.

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    2. Pagar juros é obrigação de qualquer entidade que tenha dívidas a entidades bancárias. A única excepção que eu conheço em Portugal que não o faz é o Sporting Clube de Portugal.
      Pagar juros ou ter acordos não é sinónimo de PER, senão toda a gente que paga juros da casa ou do carro estaria no PER.
      O FCP ou SLB não têm qualquer reestruturação financeira compulsiva acordada com os bancos, sem obrigação de pagamento de juros, com a obrigatoriedade de amortização da dívida consoante a entrada de receitas que estão de antemão marcadas. Nenhum deles está sob um PER.
      Vai uma grande confusão nessa cabecinha.

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    3. Realmente precisas de ser anónimo para vires com essa quantidade de disparates. Portanto Benfica e Porto estão sólidos e o Sporting está a braços com um PER?

      Então o prejuízo de 70M do Porto no último exercício e o Fair Play financeiro são o quê? Sonhos de uma noite de verão?

      O Benfica então nem se fala, no ano passado iam emagrecer porque o tinham que fazer, mas logo que JJ assina pelo Sporting abriram os cordões à bolsa e gastaram mais que os outros dois. O passivo já vai nos 600M e continua a subir, mesmo com o clube a apresentar lucros fictícios e vendas estratosféricas em mendilhões.

      Quando as actuais direcções de Porto e Benfica saírem é que se vão saber os podres, o Sporting descobriu-os à 4 anos, e foi essa casa que BdC arrumos, aliando a isso a melhor pontuação no campeonato, e que só não valeu o título, porque o Benfica tem jogado sistematicamente com 14 homens contra 11 das outras equipas.

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    4. "FCP ou SLB não têm qualquer reestruturação financeira compulsiva acordada"
      O Sporting também não. Aliás, ninguém tem. Uma reestruturação financeira ou e compulsiva ou é acordada. A do Sporting foi acordada. E é isso que dói ao porto e ao benfica que bem tentam algo do género.

      "sem obrigação de pagamento de juros, com a obrigatoriedade de amortização da dívida consoante a entrada de receitas que estão de antemão marcadas"
      Se tivermos em consideração que o empréstimo sem garantias só existe nos livros (e talvez, para aí, à Microsoft ou a empresas triple A), um empréstimo sem juros com a entrega de receitas futuras como garantia é o melhor dos mundos para qualquer clube de futebol.

      "Nenhum deles está sob um PER".
      Pois não. O Sporting também não está. Ai como eles gostariam de ter um "PER" assim...

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